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domingo, 28 de março de 2010

Parábola para todos que temem a mudança (e para eu mesmo)


Um guerreiro (não um cavaleiro), oriundo das áreas montanhosas, incultas e repletas de florestas do norte do reino de Sanpalus, após desilusões amorosas, aventuras sexuais e coisas típicas da juventude, um dia conheceu uma bela moça, vinda dos Reinos Interiores, uma região muito atrasada, que falsamente dizia seguir a religião que desprezava  a matéria e o corpo e só se importava com o espírito. Ele ficou desconfiado, mas ela disse ser diferente de suas parentes e conterrâneas e o convenceu de que não era uma mocinha desesperada por casar com um poltrão que a sustentaria e a suportaria, ao participar de muitas das aventuras e loucuras do doidivanas  guerreiro, que julgou ter encontrado a mulher certa, pois diferente das outras.
Como ocorre nessas histórias, casaram-se. E como ocorre nas histórias de verdade, as histórias que revelam as verdades, ela mudou muito após o matrimônio: perdeu o bom humor e o gosto pelas aventuras, exigiu que o guerreiro deixasse de lado os esportes imbecis que praticava com amigos imbecis, seu ciúme tornou-se uma verdadeira praga - passou até mesmo a controlar seu vestir, pois estava certa de que se vestia apenas para impressionar outras moças e possuí-las.  
O guerreiro tinha várias falhas de caráter, mas ao menos uma qualidade: jamais se dobrar às exigências absurdas e à histeria de uma mulher, principalmente uma interiorana e comum, como a  sua antiga princesa se mostrou. Brigaram e discutiram muito, ela até mesmo o agrediu com tapas e socos algumas vezes, mas ele tudo suportava, pois já havia brotado e florescido, daquele casamento, alguém que  tornava tudo aquilo suportável: uma princesinha, uma pequena mulher, que ele amava acima de tudo.
Mas mesmo a renovada paciência e abnegação de um guerreiro podem acabar e a de nosso herói extinguiu-se como o bafo de um dragão moribundo, após seu último suspiro, quando a mãe da princesa veio residir com eles e nosso guerreiro topou com algo estranho, assustador e terrível: a velha era uma verdadeira bruxa, uma íntima das trevas e sua presença inspirou a filha a tornar-se o mesmo.
Algum tempo depois, quando o guerreiro estava mergulhado em uma situação que indignou até mesmo outras princesas e mulheres, sempre prontas a defenderem a própria raça, a princesa comunicou que usaria a herança de seu falecido pai para comprar um novo castelo, em que todos residiriam juntos, um castelo projetado de forma a elas sempre saberem o que ele estava fazendo, com quem falava pelo comunicador mágico. Ele tremeu de fúria e ódio, mas nada disse. O novo castelo ficava no fundo de um vale afastado, remoto, um lugar bonito mas que escondia podridão em todos seus cantos, distante de toda a vida social e variedade humana que fervilhava onde antes residiam. Elas estavam felizes e satisfeitas, ele cada vez mais infeliz e revoltado. O novo castelo era a tumba do guerreiro, que sentia morrer um pouco a cada dia passado ali.
Até que uma noite ele esperou elas adormecerem e fez algo que há muito deixara de lado: a pé, sem seu cavalo, subiu através do vale maldito, habitado por esnobes, falsos religiosos e gente grosseira obcecada por riqueza, alcançou a Grande Avenida e embrenhou-se na Rua Grande e seus arredores. Lá, reencontrou-se com seu passado, seu verdadeiro ser e sua força interna. O frenesi de luzes, movimento, vida, variedade, o desfile da humanidade e suas múltiplas formas de viver, as mulheres que conheceu e tomou, tudo o preencheu de tal forma que ao retornar, quando já era dia claro, anunciou que partiria para sempre, rumo a seu verdadeiro ser e ao seu verdadeiro reino. A indignação foi grande, os homens da família da princesa o ameaçaram – derrotou e humilhou um a um em combates medonhos – , a princesa chorou e gritou, mas ele, sem jamais esquecer ou abandonar sua pequena princesa (muito pelo contrário), partiu, sem medo de ser o que realmente era.  

   

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