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sexta-feira, 6 de janeiro de 2023

Baudelaire, mais uma vez

 


 Esta semana encontrei outra grande amiga; conversa vai e vem, perguntamos sobre amigos, conhecidos, fofocamos um tanto. Eis que ela pergunta sobre o rapaz que protagonizou postagem anterior, um sujeito que se deixou dominar e se explorar completamente por uma mulher, em nome do 'amor'; na postagem em questão citei a certeríssima fala da mais sábia mulher que já conheci, também sabedora do caso, que disparou:

"Incrível como vocês homens são tontos. É assim mesmo? Para ter uma buceta garantida vale tudo, até ser explorado, sugado, dominado até o limite?"

Os caros leitores se lembraram? Pois bem, relatei a esta minha outra amiga que na última vez na qual encontrei o sujeito ele estava ainda mais farto, cansado da situação, não se importou nem um pouco que as pessoas ao redor ouviram suas queixas. Mas infelizmente ele ainda não tomou a atitude que deve tomar!

Minha amiga ouviu atentamente e ao final, mostrou sua verve e cultura:

"É, cada um carrega sua quimera mas só olha a dos outros, nunca repara na sua, como escreveu Baudelaire."

Claro que fiquei interessado no ato e pedi que ela me mostrasse o texto em questão, cuja tradução transcrevo a seguir. 

É uma ótima fonte de reflexão sobre o caso desta postagem e também sobre o patético comportamento humano em geral.

Saudações canalhas e cafajestes

CADA QUAL COM SUA QUIMERA


Sob um grande céu cinza, numa grande planície empoeirada, sem caminhos, sem relvados, sem um cardo, sem uma urtiga, encontrei vários homens que caminhavam curvados.
Cada um deles carregava nas costas uma enorme Quimera, tão pesada quanto um saco de farinha ou carvão, ou o equipamento de um infante romano.
Mas a monstruosa besta não era um peso inerte, ao contrário, envolvia e oprimia o homem com seus músculos elásticos e possantes; agrafava-se com suas duas vastas garras no
peito de sua montaria; sua cabeça fabulosa sobrepunha-se na fronte do homem, como um desses capacetes horríveis pelos quais os antigos guerreiros contavam acirrar o terror do inimigo.
Questionei um desses homens e lhe perguntei aonde iam assim. Respondeu-me que de nada sabia, nem ele nem os outros, mas que evidentemente iam para algum lugar, já que eram impelidos por uma invencível necessidade de caminhar.
Coisa curiosa de se notar: nenhum desses viajantes tinha o ar irritado com a besta fera suspensa em seu pescoço e colada em suas costas; diríamos que ele a considerava como parte
de si mesmo. Todos esses semblantes fatigados e sérios não testemunhavam nenhum desespero; sob a cúpula spleenética do céu, os pés mergulhados na poeira de um solo tão desolado quanto este céu, eles caminhavam com a fisionomia resignada de quem está condenado a sempre esperar.
E o cortejo passou ao meu lado e se embrenhou na atmosfera do horizonte, no lugar onde a superfície rotunda do planeta se furta à curiosidade do olhar humano.
E durante alguns instantes, obstinei-me a querer compreender este mistério; mas logo a irresistível indiferença abateu-se sobre mim e destarte fiquei mais pesadamente afligido quanto
eles mesmos por suas esmagadoras Quimeras.

Tradução: Ana Lúcia Paz Magalhães

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